Uma campanha política comparada à obra de caridade: “foi silenciosa, sem dinheiro e deu resultado”.
por Tatiane D. da Silva
Jean foi o candidato que apareceu na televisão no horário político, acompanhado pelo pai e o irmão, o saxofonista Giovanni de Luchi conhecido na cidade por animar festas e eventos sociais. O apelo lhe rendeu uma ‘notinha’ no jornal, com o título “Um candidato de família”, que guarda com cuidado dentro da carteira, dobrado em quatro partes.
Em março deste ano, enquanto lia o “Evangelho Segundo o Espiritismo”, Jean diz ter sido tomado por um sentimento inspirador, que o motivou a querer participar da política. Na mesma semana, Nildomar Freire, o “Nildão”, lhe telefonou convidando para assistir as prévias que escolheriam o candidato à Prefeitura de Florianópolis, pelo PT. No dia do evento, Luci Choinack, presidente do partido em Santa Catarina, fez um discurso que o inspirou ainda mais. Dizia que as pessoas precisam acreditar mais no ser humano, e que não deveriam permitir que correntes partidárias corrompidas influenciassem a vida das pessoas.
Assim que Nildão foi escolhido o mais novo candidato à prefeitura de Florianópolis, Jean o cumprimentou pela conquista e se ofereceu para concorrer à disputada vaga na câmara, pelo PT. Para que isso fosse possível, precisaria provar que tinha a representatividade de uma parcela da população. “A partir daí precisei reunir moradores do bairro onde moro e amigos para mostrar que eu tinha raiz na comunidade e poderia disputar as eleições”, conta.
Um caminho a seguir - Na pequena sala de uma clínica de fisioterapia, rodeada por uma academia de ginástica, piscina coberta e uma acolhedora varanda repleta de plantas, Jean aperta o play de um som portátil, e uma música instrumental, dessas para relaxamento, começa a tocar. O sotaque ‘mané’ na fala, não deixa dúvidas sobre sua origem. Nascido em Florianópolis e criado no bairro de Capoeiras, é lá que vive até hoje. Sua jornada de trabalho começa 8h da manhã e termina às 18h da noite. Na clínica onde trabalha como autônomo fatura em média R$600 por mês, e quando a “safra é boa”, consegue tirar R$1.500. Além da rotina de tentar recuperar a coluna dos pacientes através da Quiropraxia, Jean ministra palestras em diversos centros espíritas na cidade.
Um dos caminhos que percorreu durante a campanha para conquistar a simpatia dos eleitores foi o que levava até os fisioterapeutas, os doutrinários do Espiritismo e os idosos. Em 1993, enquanto conversava com dona França, já falecida, uma senhora que vivia no Lar dos Velhinhos de Zulma, em São José, prometeu a ela que estudaria fisioterapia somente para cuidar dos ‘velhinhos’. Nesse dia, decidiu que iria abandonar a profissão de técnico em eletrônica para se dedicar ao curso pré-vestibular e conseguir entrar na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC).
Os motivos que levaram tomar essa decisão não foram poucos. Ele já viu médico prescrever remédio sem saber para que idoso estava receitando. Já viu filhos abandonarem a mãe e só reaparecerem para assinar o atestado de óbito e saber da herança. Esses, entre outros episódios, fizeram com que Jean se tornasse um fisioterapeuta especializado em Gerontologia, um campo que estuda os fenômenos do envelhecimento humano.
Liderando – Na universidade Jean liderou grupos. Foi um dos precursores do centro acadêmico de Fisioterapia que, segundo ele, conseguiu várias conquistas. Uma delas foi unir o curso de Educação Física junto à Fisioterapia, fazendo com que as duas colocassem fim a rivalidade que tinham, pois um achava que o outro tomava seu espaço no mercado de trabalho por atuarem em áreas afins. Também conseguiu com que toda a grade curricular fosse modificada. “O currículo estava muito ultrapassado. Fui de aluno em aluno saber o que eles queriam sugerir para a nova grade”, relembra.
Assim, como quase todo líder, Jean sofreu perseguições. No centro acadêmico, ele mobilizou os alunos da universidade para protestarem contra o reitor na época, Raimundo Zumblick, que segundo ele, tinha uma visão de ‘direita’, e intenções de privatizar a UDESC. Alguns professores sentiram-se ameaçados, pois a queda do reitor significava demissão de muitos deles. Jean chegou a receber telefonemas anônimos avisando para que parasse com o ‘agito’, se não correria o risco levar uma ‘surra’ na primeira esquina que passasse. A atuação do rapaz e a dos colegas chamou a atenção da senadora Ideli Salvati, na época deputada, que também brigava contra Zumblick, e o chamou para fazer parte do partido. Em 1998, Jean se filiou PT. Desde então, participa dos eventos e votações internas.
Briga pela vaga – “Olha, sou contra partidarizar o movimento espírita, mas você já parou para pensar quantos parlamentares são católicos, evangélicos , materialistas e ateus? Por isso sou favorável que a gente opte por candidatos que estejam mais afins com os nossos ideais da outrina Espírita. Comprometidos com o bem, a verdade, a justiça e a caridade. Então, por que não ter um representante espírita na câmara?”Este foi o argumento que Jean usou nos e-mails enviados aos membros do movimento espírita, para convencê-los de que merecia o voto. Da mesma forma, fez com os colegas de profissão da fisioterapia. E-mails para todos. Conforme os cálculos de Jean, Florianópolis tem 500 fisioterapeutas, mais os estudantes e 40 centros espíritas, com média de 80 participantes cada.
Apesar de animadora quantidade de possíveis eleitores a seu favor, conseguiu apenas 0,58% dos votos nas urnas. Segundo Jean, sua campanha foi a melhor no quesito ‘custo – beneficio’. Ele conta que viu candidato gastar R$150 mil e conseguir somente 700 votos. Outro, R$80 mil e 180 votos. Para os R$ 4 mil que investiu, Jean considera seu desempenho, bom. “Minha campanha foi barata e eficaz”, diz.
Ele prefere fazer sua campanha política sem dinheiro, sustentado apenas na dignidade. Explica que não quer dever nada a ninguém, diferente de muitos candidatos, que segundo conta, foram financiados pelo narcotráfico, maçonaria e indústria farmacêutica. “Quem entra com o ‘rabo preso’ não pode defender as suas idéias, e sim as de quem os financiou”, conta. O ex-candidato reforça sua posição, lembrando um momento da vida quando abandonou a função de técnico em eletrônica, onde ganhava bem, para se dedicar ao vestibular e conseguir estudar fisioterapia com a intenção de fazer algo que gostava e poder ajudar os idosos.
Aprendizado - Como trabalha o dia inteiro, Jean não teve o tempo que gostaria para se dedicar a sua campanha. Os momentos livres aos finais de semana aproveitava para comparecer à festas e eventos e angariar votos. O saldo que ficou dessas eleições, segundo Jean, foi o aprendizado com as experiências que viveu. Sendo o petista fiel que é, negou o convite para fazer parte de outros partidos que ficaram de olho no seu desempenho nas eleições.
O fracasso do PT das urnas - foi o 4º colocado entre os partidos – segundo Jean, se dá porque seus candidatos não possuem envolvimento com a comunidade. “O meu envolvimento comunitário provou isso nas urnas. O resultado é resposta de anos em trabalhos voluntários e de outras atividades que desenvolvi”, conta.
Para a próxima eleição municipal, Jean quer se preparar melhor. Vai organizar uma equipe de campanha para trabalhar com ele e vai procurar se envolver ainda mais nos trabalhos com a comunidade. “Para 2012, Jean é com ‘J’ e não ‘G’, não se esqueça”, brinca.
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